(Foto: Jornal Folha da Cidade)
Presidente da CCJ (Comissão de Constituição e
Justiça), a deputada bolsonarista Bia Kicis (PSL-DF) pautou duas propostas no
principal colegiado da Câmara para limitar a atuação do STF (Supremo Tribunal
Federal).
Bia Kicis é investigada no inquérito das fake news
e no que apura atos antidemocráticos. Assim como Bolsonaro, é crítica do
isolamento social para evitar a propagação do novo coronavírus.
A iniciativa dela na
CCJ se dá em um contexto de crescentes críticas de deputados e senadores ao que
chamam de ativismo judicial dos ministros. Incomodam em especial decisões com
impacto no Congresso. Dois casos recentes ilustram as queixas. O primeiro é a prisão de Daniel
Silveira (PSL-RJ), no dia 16 de fevereiro, por ordem de Alexandre de Moraes. O
deputado publicou vídeo com ataques e ofensas a integrantes do Supremo.
Já no dia 8 de abril, Luís Roberto Barroso mandou o
presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), instalar a CPI da Covid. A
comissão parlamentar de inquérito vai apurar a condução da pandemia no país.
Na Casa ao lado, o colegiado foi instalado na
terça-feira (27). E, nesta quarta (28), por 11 a 0, os ministros tornaram
Silveira réu e abriram uma ação penal por crimes previstos na Lei de Segurança
Nacional e no Código Penal.
Nos dois casos, as
decisões monocráticas foram confirmadas pelo plenário do Supremo. Um deles quer modificar as regras para concessão de decisões monocrátricas de
natureza cautelar –que antecipam provisoriamente o efeito do pedido até o
julgamento do mérito– nas ADIs e ADPFs.
A proposta é de autoria do deputado João Campos
(Republicanos-GO). A relatoria é do colega de legenda de Kicis, Felipe
Francischini (PSL-PR).
Segundo o relator, a ideia é explicitar em lei que
trata dessas ações que medidas cautelares precisam do aval da maioria absoluta
dos ministros do Supremo.
Francischini diz que decisões monocráticas têm
elevado impacto jurídico, econômico e social. Cita como exemplo as ADIs sobre
tabelamento do frete, transferência de controle acionário de estatais e criação
de tribunais regionais federais.
“Não se cuida, pois, apenas de indesejável
morosidade judicial, mas especialmente do evidente ‘apoderamento’ transitório
de uma competência do plenário, posto que a decisão monocrática de ministro
passa a substituir, no tempo e no mérito, a decisão colegiada requerida por
nossa lei maior [a Constituição]”, afirma.
No entanto seria aberta a possibilidade de, durante
o recesso, em caso de extrema urgência e perigo de lesão grave, o presidente do
STF conceder medida cautelar a ser referendada pelo plenário até a oitava
sessão após a retomada das atividades.
O texto ainda proíbe decisão monocrática de
natureza cautelar em ADI ou ADPF em sentido contrário a tema já decidido pelo
colegiado.
O outro projeto em pauta restringe a extensão das
ADOs (ações diretas de inconstitucionalidade por omissão). A proposta é de
autoria da deputada Chris Tonietto (PSL-RJ) e relatada pelo colega de partido
Vitor Hugo (GO).
O projeto inclui dois dispositivos no artigo sobre
ADOs na lei que trata de processo e julgamento de ADIs e ADCs (ações
declaratórias de constitucionalidade) perante o Supremo.
O primeiro diz que
não será objeto de ADO matéria que tenha tramitado no Congresso Nacional, em
qualquer uma de suas fases, na Câmara ou no Senado, pelo período correspondente
aos últimos cinco anos.
O outro dispositivo diz que não será objeto de deliberação a ação que se fundar
em qualquer dos itens constitucionais “de ordem puramente principiológica”.
O texto chegou a ter o parecer proferido na CCJ
nesta quarta, mas não avançou por pedido de vista de deputados da oposição que
criticam a decisão de pautar esses projetos.
“Os dois projetos que limitam as decisões do STF,
assinados e relatados pela extrema direita, são uma retaliação à prisão de
Daniel Silveira e às decisões corretas do STF que barraram decretos e ações
inconstitucionais do presidente Jair Bolsonaro”, diz a deputada Fernanda
Melchionna (PSOL-RS).
“É grave que a principal comissão da Casa seja
palco desse tipo de projetos, mas previsível tendo a presidente que têm”,
afirma.
Para a deputada Maria do Rosário (PT-RS), a pauta é
preocupante. Ela critica ainda o fato de os projetos serem relatados por
congressistas do partido de Kicis.
“De fato, a extrema direita visa o pensamento único
contra a diversidade. Nosso enfrentamento é contra o autoritarismo e o poder
absoluto que pretendem [ter]”, diz Rosário.
Porém as iniciativas têm respaldo de congressistas
de outras legendas. O deputado Kim Kataguiri (DEM-SP), por exemplo, diz que há
abusos nas concessões de liminares monocráticas.
“É uma reação ao Supremo Tribunal Federal pelos
avanços contra o Poder Legislativo e contra o Poder Executivo, de usurpação de
competência que a corte tem protagonizado nos últimos anos”, afirma.
O deputado Rubens Bueno (Cidadania-PR) avalia que
as discussões sobre a atuação do Supremo são cada vez mais necessárias para o
equilíbrio e a harmonia entre os Poderes.
Para ele, no entanto, o projeto que trata das ADOs
precisa ser analisado com “muito mais cuidado e parcimônia” por proibir
fundamentação principiológica, “o que poderia afetar drasticamente a
competência do STF para interpretar o texto constitucional”.
Já o deputado Gilson Marques
(Novo-SC) considera os dois projetos positivos. “Não cabe a burocratas não
eleitos acelerarem o trâmite de projetos de lei em discussão nem decidir em que
pautas o Legislativo deve atuar”, diz.